Seja na crise ou fora dela, a graduação ainda tem um papel de destaque na jornada pelo emprego, salários e estabilidade
No atual contexto de crise, muita gente tem se questionado se o diploma ainda tem grande valor na busca por um emprego. Por outro lado, seria possível se empregar bem sem diploma? Parece um paradoxo, mas na verdade a resposta é bem simples: a graduação pode não resolver todos os problemas, mas é parte da solução e, sem ela, as chances são mínimas.
Carreira e área de formação
De acordo com o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), com mestrado executivo em gestão empresarial, administração de empresas, especialista em inovação e com atuação em mais de 25 países, Arthur Igreja, é preciso levar em consideração o contexto regional e os segmentos dentro da economia antes de fazer uma análise mais profunda sobre empregabilidade.
“O cenário brasileiro impacta muito, especialmente quando se estratifica isso por regiões. Tem estados, como Santa Catarina, com o nível de desemprego inferior a 7% e estados como na região Norte e Nordeste com índices de quase 20%”, declara.
O professor ainda pontua que o contexto de área é mais abrangente do que parece. “Não é o fato da pessoa ter se alocado na área que é algo bom ou ruim. É absolutamente normal ter uma graduação – que é só o começo da trajetória profissional – e se encontrar, ter competências e aptidões que, na verdade, têm um fit melhor com outra área“.
Para exemplificar, ele cita a própria história. “Eu, por exemplo, sou engenheiro, atuei um período com engenharia, mas faz muito tempo que brinco que não sou mais engenheiro. Entretanto, as aptidões me ajudam com capacidade analítica para outras coisas que faço hoje”, declara.
Diploma e emprego
O diploma não perdeu espaço, pelo contrário. Contudo, o conceito de área pode ser mais abrangente do parece. “No passado, o diploma era, de fato, uma alavanca social muito forte e, hoje, é uma boa alavanca”
Arthur complementa destacando o fato de que mercado está menos interessado no título em que a pessoa carrega e mais interessado em que problemas ela resolve. “Crises potencializam esse comportamento, porque as empresas pensam no curto prazo, ou seja, querem que o funcionário dê resultado amanhã e não daqui a seis meses”.
As estatísticas ajudam?
Recentemente, foi divulgada uma pesquisa do Núcleo Brasileiro de Estágios (Nube), que mostrava que 25% dos graduados conseguiram se empregar na área em menos de três meses. Questionado sobre as estatísticas de empregabilidade na área o professor pontuou: “acredito que esse é um bom índice e atrelado às necessidades que são muito verticais no mercado”.
Para explicar, o professor usou o exemplo da área de TI, que chega a ter estatísticas de empregabilidade dentro da área de 90% dos profissionais. “Isso para estudantes ainda em formação, com mais de seis meses de curso, que já são alocados no mercado, seja através de estágio ou CLT”.
Ainda segundo o professor, cursos mais específicos, com uma cara de tecnólogo do que bacharelado têm alta empregabilidade. “Contudo, 25% como média total nos cursos no país me parece um índice bom”, acrescenta.
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Formação de nível superior e mercado de trabalho
O mercado de trabalho e o ensino superior vivem em impasse. Por um lado as instituições têm certeza de que formaram bons profissionais e, por outro, o mercado diz que está difícil encontrar profissionais completos.
Para o professor Arthur Igreja, é hora das instituições de ensino se renovarem. “O Brasil está ficando para trás. Existe um distanciamento, uma desconexão do que está se formando e do que o mercado espera. Em relação às mudanças, elas são muito vagarosas. Em conversas com coordenadores de cursos e reitores, é possível perceber que muitos deles se sentem tolhidos. Afinal, o mercado já sinalizou que quer mudanças, mas eles não conseguem implementar as demandas com facilidade. Por isso está crescendo muito o mercado de cursos independentes/rápidos, sem titulação, justamente para atender essa demanda”.
Novas perspectivas
A última grade mudança ocorrida, do ponto de vista de Arthur Igreja, foi a de formato, com a expansão vertiginosa do EAD, pressionada pela redução de custos e por aumentar a capilaridade. “Comparado aos outros países, o Brasil está bem atrás”.
Todavia, graduados podem sim, respirar mais aliviados. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), de 2018, mostram que, na comparação interanual, as maiores retrações do desemprego ocorreram nos grupos de trabalhadores com o ensino fundamental completo e incompleto. O que, de acordo com o instituto, é compatível com o aumento no tempo de estudo da população brasileira.
O gráfico abaixo mostra o nível da População Ocupada (PO) ano a ano no Brasil e explicita as diferenças entre as camadas mais e menos instruídas.
Fonte: IPEA/IBGE
A pós-graduação
Dados do Panorama do Ensino Superior Brasileiro, desenvolvido pela Quero Educação, complementam as estatísticas do IPEA, pois mostram que, hoje, os alunos que optam por fazer pós-graduação e MBA estão em busca de avanços na carreira, com cargos de gestão e maiores salários, o que fica evidente pela faixa etária média dos alunos desses cursos, com pico entre 28 e 30 anos.
Logo, podemos associar maiores graus de instrução a maiores salários. Tendência que acompanha a demanda por educação continuada, tendo em vista um mercado de trabalho cada vez mais exigente.
O estudo também mostra as áreas preferidas pelos alunos nesses cursos. A maior parte deles escolhe cursos na área de gestão, o que corrobora a hipótese de busca por aprimoramento na carreira, como mostrado no gráfico abaixo.
Dessa forma, podemos associar maiores graus de instrução a maiores salários. Tendência que acompanha a demanda por educação continuada, tendo em vista um mercado de trabalho cada vez mais exigente.
Graduação e salários
A exemplo do que já aconteceu no passado, podemos estar vivendo uma mudança de paradigma. Afinal, a educação de nível superior não se encerra nela mesma e as exigências no mercado de trabalho já são outras. Contudo, a graduação, evidentemente, provoca impacto positivo.
De acordo com dados de um estudo feito pelo pesquisador Sergio Firpo, professor do Insper, em 2018, um trabalhador com ensino superior completo tem um rendimento médio de R$ 4.911,66, enquanto um brasileiro com até um ano de estudo ganha R$ 859,81. A diferença entre os rendimentos dos dois grupos, é de 471%,maior que em 2017, de 443%. Mas já foi ainda pior: em 2012, os mais escolarizados ganhavam em média quase 500% a mais que os que tinham até 1 ano de estudo.
A pesquisa mostra, ainda, as diferenças salariais entre os níveis de escolaridade no país, como evidenciado pelo gráfico abaixo.
Fonte: Sérgio Firpo (Insper)
A graduação ainda é um pilar importante para a promoção da ascensão social e estabilidade no emprego. O professor Arthur ainda faz questão de comentar a chamada “falácia” do empreendedorismo. “O ensino superior continua sendo essencial para criar base, repertório, discurso. Então, não se pode cair naquela história de empreender, porque tem tudo na internet”.
E não para por aí, o professor complementa. “Você só consegue ser excelente a partir do momento que domina o básico com muita propriedade. Então, o ensino superior deixou de ser a linha de chegada e passou a ser o começo de uma trajetória profissional de sucesso e o jovem tem que estar atento a isso”.